A vila está deserta ao meio-dia. O termómetro da farmácia Portugal regista pelo segundo dia consecutivo a marca 50 (...) O i foi visitar a vila famosa pelos recordes de temperatura - o último, confirmado pelo Instituto de Meteorologia, foi em 2003, com 47,3 oC. Ontem, pelo segundo dia consecutivo, o já emblemático mostrador da Farmácia Portugal, no centro da vila, atingiu os 50 oC por volta do meio-dia. Chega-se pela Estrada Regional 385. O termómetro do carro aponta 42 oC, sempre a subir desde Évora. A vila está completamente deserta e à partida não dá para perceber se por falta de gente ou por reclusão. O professor Revez deixa interromper a aula. "Não digo que não marcasse os 50 oC, mas não é verdade de certeza absoluta", atira Maria Angelina Carreteiro, 50 anos. É que se tivesse sido, e isto é de gente que sabe, não se aguentava sair de casa, e elas estão ali. "Foi sempre assim, os antigos ainda sofriam mais do que nós. Eu ainda andei no calor no campo, de xaile, lenço e manguitos. Agora é que estranhamos o calor", acrescenta Joaquina Piriquita, 51. No lar do centro social da Amareleja, paredes-meias com a casa do povo, o fresco vem das portadas fechadas. Marcolino Correia, 83 anos, aceita falar. Passa os dias entre cassetes de música, auscultadores à séria e desenhos de mulheres que começam sempre com uma lembrança da sua. Saiu da Amareleja aos 20 e voltou em 2000. "O calor a gente já não sente, mas antes o que havia era mais chuva. Carregávamos os fardos de palha debaixo de chuva e trovoada; agora chove pouco ou nada." dava-LHES o preto É difícil encontrar gente nova, apesar de serem cerca de dois mil habitantes. A vila tem escola básica, mas depois segue-se para Moura. E de qualquer forma é o início das férias. "Quem pode vai para o estrangeiro. Quem fica pega pelas 6 horas, agora anda-se na apanha do melão e da melancia para os lados do Alqueva", explica Joaquina Piriquita. Já a mais velha toda a gente sabe quem é: Chica Ramos. O genro Marcelino Botelho, 75 anos, é o anfitrião da casa. Durante anos foi o único barbeiro na vila, agora há um cabeleireiro moderno em frente à Farmácia Portugal. O negócio vai estando parado, sobretudo na hora de maior calor, e muitos vêm pelo pente zero, que demora a crescer, ri. "Lembro-me de um domingo há 15 anos, acho que foram 48,7 graus, estava na pesca e os peixes nem se mexiam dentro de água", conta numa sala adaptada a barbearia, com uma cadeira das antigas ao centro. "Lembro-me de haver dias de muito calor e muito frio, até de cair neve aí nos anos 40, e isso nunca mais aconteceu. E quando era Verão, era Verão", remata. "Até havia aí um ditado quando se queria castigar alguém: 'O que te desejo é seis meses iguais aos de Agosto'." Chica Ramos, 98 anos feitos em Junho e que na realidade se chama Francisca Guinapo Arranjado - na vila ninguém se conhece pelo nome próprio, explicam-nos - domina outras expressões. "Com o calor dava o preto a muita gente", explica. "Já eu nunca perdi o algarismo" - nunca desmaiou. E fala da doença de Parkinson quase como se não fosse sua, com uma idade invejável. "O calor? Eu já não tenho idade para aguentar nada", brinca. Mas tem, só que o calor não a deixa sair de casa para se distrair com a "conversinha do passado." Dantes ia para a rua; agora não acha posição em casa, apesar de um dos segredos ser manter tudo fechado como a encontramos, às escuras no sofá da sala. "Íamos mal vestidas, deitávamo-nos no chão, ao pé da porta da rua, comíamos gaspachozinhos." Pôr cestas com comida a refrescar dentro dos poços é outra das coisas de antigamente: agora o pior é quem não tem ar condicionado e se contenta com a ventoinha. A tarde vai correndo. O termómetro do carro mantém os 42 oC já bateram as seis da tarde. Domingos Silva, 84 anos, também a não parecerem, passa apressado à frente da Farmácia Portugal. "São quase dois quilómetros que faço de casa até ao centro e com este calor não há ninguém a quem dizer bom dia ou boa tarde", puxa conversa. Mas é falta de gente? "Não, está tudo em casa à espera que a sombra tape as ruas. Tinha de ver nas festas de Agosto, nem se consegue andar aqui", garante. Diz que dali a duas horas vão estar uns 50 a jogar malha ao pé da torre do relógio, o momento de convívio de todos os dias. "50 oC? Eu nem olho para o termómetro. Estive em Lourenço Marques, com 50 oC as galinhas morriam nas capoeiras. Para a agricultura é menos mau, as searas só se vão com gelo. E nós estamos aclimatizados." Nós não. "Que calor", dizemos. "Aqui diz-se 'que calma'", responde. |
EcoTretas é um espaço dedicado a evidenciar os disparates que se dizem e fazem à volta da Ecologia. Especialmente dedicado aos ecologistas da treta, essa espécie que se preocupa mais com uma pata partida de um qualquer animal, do que com um fogo florestal! Aqueles que são anti-americanos, mas que gostam do Al Gore.
quinta-feira, 8 de julho de 2010
Farmácia Portugal
Aparentemente, a Farmácia Portugal é a farmácia dos célebres 50ºC da Amareleja. Quando tudo fazia crer que não era possível fazer pior que a reportagem da TVI, apareceu o jornal i, para mim claramente o pior jornal do momento! E a reportagem que eles fizeram, e que pode ser consultada aqui (provavelmente será apagada), merece ser citada para a posteridade (realces da minha responsabilidade), pois pior acho que não é possível: