sábado, 20 de fevereiro de 2010

Tragédia na Madeira

Num dia que é de luto para muitos Madeirenses, pela tragédia que se abateu sob a forma de dilúvio sobre a ilha, interessa saber como a comunidade meteorológica se comportou neste domínio. Afinal, se eles são capazes de prever o Aquecimento Global, deviam ser capazes de alertar adequadamente a população e os responsáveis.

No Diário de Notícias do Funchal, na quinta-feira, o delegado do Instituto da Meteorologia na Madeira, Vítor Prior, avançou com "O pior já passou, em termos de precipitação". Quanto a previsões para hoje, nada! A edição de hoje, que saiu para as bancas, está exposta acima à esquerda. Dá para perceber o que falhou!

No Jornal da Madeira, ontem, falava-se dos valores especiais de quinta-feira. Previsão para hoje: "Depois, no sábado, voltam os aguaceiros, com o vento a soprar forte". Todavia, a edição de hoje trazia na primeira página uma notícia mais adequada, conforme se pode ver pela segunda imagem acima. O texto assume que existia algum conhecimento para a situação, pelo que quem ainda conseguiu hoje ler o jornal ficou avisado, pelo menos para a parte da tarde: "Face às previsões meteorológicas para hoje, que apontam para chuva e vento muito forte em toda a ilha a partir da madrugada, mas com particular incidência à tarde (entre as 12 e as 18 horas)".

No site do Instituto de Meteorologia, um comunicado saído hoje às 18:59 (só é válido até dia 23?), enuncia aquilo que já se havia topado: colocaram o alerta vermelho, depois de terem reparado que tinham caído 52mm na hora anterior:

Esta situação determinou a emissão de avisos de precipitação pelo Instituto de Meteorologia, I.P., a partir do dia 19, às 19h25, elevando-se o nível de severidade ao longo da evolução do fenómeno, tendo sido emitido aviso vermelho ? o nível mais severo na escala de avisos utilizada pelo IM - às 10 h do dia 20.
Os valores mais elevados de precipitação acumulada numa hora registados nas estações Funchal-Observatório e Pico do Areeiro foram respectivamente 52 mm (entre as 9 e as 10 h) e 58 mm (entre as 10 e as 11 h). Entre as 6 e as 11h registaram-se 108 mm e 165 mm nas estações mencionadas. O valor acumulado em 6 horas na estação Funchal-Observatório foi superior ao valor normal de 30 anos (1961-1990).

Já neste Domingo, o Diário de Notícias dá uma ideia mais clara das desprevisões do Instituto de Meteorologia:

Pelas 19.25 de sexta-feira foi emitido o aviso amarelo de precipitação que corresponde à queda de dez milímetros de chuva por hora (mm/h). Entretanto, o satélite permitiu aos técnicos antever um agravamento da situação, pelo que às 08.52 de ontem o aviso mudou para laranja (queda de chuva entre 20 a 40 mm/h), passando às 10.00 para vermelho (queda de chuva acima dos 40 mm/h). Mas, na realidade, entre as 09.00 e as 10.00 choveram 52 mm/h; ou seja; bastante mais do que o previsto.

Até os amadores fizeram melhor, como é visível num fórum nacional de meteorologia, onde o primeiro alerta é de ontem às 22:25.

Entretanto, já andam a desconversar, com a excepcionalidade do dilúvio. Diz Costa Alves, no Diário de Notícias:

Os valores ainda não estão confirmados pelo Instituto de Metereologia, mas os dados das estimativas são arrasadores: "No Pico do Arieiro, os valores recolhidos foram de 185 litros por metro quadrado", diz ao DN Costa Alves. O meteorologista diz que nunca se viu coisa assim em Portugal. "Lembro-me de alguns registos até 120 litros, mas nada deste género".

Uma simples consulta no site do Instituto de Meteorologia determina que os valores até estão longe dos recordes nacionais:
  • Madeira: 277,0 mm em Encumeada em 9/12/1976
  • Açores: 276,0 mm em Furnas/S.Miguel em 03/10/1974
  • Continente: 220,0 mm em Penhas da Saúde em 14/01/1977
A compilação dos dados históricos é algo pouco habitual. Por isso, deve registar-se o trabalho de José Lemos, que tem uma página excepcional sobre os Desastres Naturais no Arquipélago da Madeira, no seu blog Madeira Gentes e Lugares.

Também recorrente nas notícias é a ideia de que tudo teria sido evitado se houvesse um radar meteorológico na ilha.

Segundo o presidente do IM, "ainda não foi adquirido um radar para a Madeira por falta de orçamento". Porém, equipamento, que custa dois milhões de euros, está instalado nos Açores e em dois locais do continente - Coruche e Loulé - e vai ser colocado um em Arouca, para fazer cobertura no Norte do País. Já segundo o governador civil de Lisboa, este não é o momento para apontar falhas, mas sim para socorrer. "Isto faz- -nos pensar que temos de ter outra atitude face às alterações climáticas, mas não é o momento para fazer crítica à falta de meios.

Fica-se a saber que o dito custa 2 milhões de euros, pelo que interessa saber que outras prioridades foram satisfeitas antes desta. Não me admirava que os orçamentos para os Aquecimentos Globais e Alterações Climáticas fossem muito superiores. Mas nós não precisamos de previsões para 2100, como agora fica evidente. Precisamos delas de um dia para o outro!

Por isso, não é de admirar que os abutres do Aquecimento Global já tenham chegado ao terreno, depois da hibernação deste Inverno. Como é o caso de Filipe Duarte Santos ontem para a Antena 1:

O professor Filipe Duarte Santos considera que o fenómeno meteorológico que causou a tragédia deste fim de semana na Madeira tende a tornar-se mais frequente. O climatologista, ouvido pelo jornalista da Antena1 Walter Medeiros, chama a atenção para a necessidade de minorar os efeitos destrutivos das alterações climáticas